A Morgadinha dos Cannaviaes. Dinis Júlio
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Название: A Morgadinha dos Cannaviaes

Автор: Dinis Júlio

Издательство: Public Domain

Жанр: Зарубежная классика

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СКАЧАТЬ jantar, sr. Pertunhas, que já ha muito para isso me chamou a criada – disse Augusto, erguendo-se como para fugir áquella conversa. – Em seguida irei aos seus rapazes.

      – Então vá, vá. Deus lhe pague o favor que me faz e permitta que eu lhe não peça muitos d'estes. E eu tenho esperanças… Sabe que ando com ideias de arranjar o lugar de recebedor, que está, como diz o outro, a encher dias? Já falei ao conselheiro; mas o conselheiro promette muito e falta melhor, sobretudo a um homem que não tenha influencia em eleições. O sr. Joãozinho das Perdizes interessa-se por mim, é verdade; mas, por outro lado, o Seabra brazileiro faz-me guerra. Eu ando a vêr se consigo pôr o Seabra a meu favor, porque emfim… Mas vá, vá jantar, que eu espero.

      – Se quizer fazer-me companhia…

      – Muito obrigado. Eu já jantei. O meio dia é a minha hora. Jante á sua vontade.

      Augusto saiu da sala. Mestre Bento Pertunhas, ficando só, deu algumas voltas cantarolando, sentou-se depois, e pegando na pasta de Augusto, poz-se a examinar os papeis que ella continha.

      Ao mesmo tempo simulava umas variações de trompa, á fôrça de contracções e esgares dos labios.

      A pasta, victima da indiscreção do mestre, era a mesma que Augusto trazia, quando o vimos no Mosteiro.

      Entre os documentos contidos n'ella algum achou o mestre Pertunhas mais curioso do que as escriptas e themas dos discipulos, pois, ao lêl-o, desenhou-se-lhe no semblante a mais intensa curiosidade e cessou de todo a exhibição acustica, que com tanto ardor encetára.

      Leu-o até o fim com crescente avidez; e depois, olhando em volta de si, para verificar que não era observado, dobrou-o e sorrateiramente o escondeu no bolso. Fechou outra vez a pasta, pousou-a no sitio d'onde a tirára, continuou a ler ou a fingir que lia com toda a attenção um livro e encetou novas variações de trompa.

      – Então já! Apre! Isso é jantar a vapor – disse o latinista, pondo-se a pé, logo que Augusto voltou.

      E momentos depois sairam juntos.

      Querendo poupar os leitores á semsaboria de assistir a uma lição de latim e a um ensaio da philarmonica, deixal-os-hemos ambos, para voltarmos ao Mosteiro.

      Ao fim da tarde, depois do jantar, estavam as duas primas sentadas ao parapeito do muro da quinta, d'onde, por sobre almargens e pomares vizinhos, a vista se espraiava em amplissimo horizonte até umas nuvens, que pareciam limital-o.

      D. Victoria saboreava, no seu quarto, as delicias da sesta habitual. As creanças brincavam a alguma distancia, e os risos e os clamores d'ellas vinham como um chilrear de passaros aos ouvidos das duas raparigas, que, a cada momento, se surprehendiam em meditativo silencio.

      A natureza estava serenissima. No occidente desenhavam-se estreitos e longos traços nebulosos, a que o sol dava um colorido tão ardente, que se o pintor paizagista o produzisse na palheta, hesitaria, ao passal-o á tela, com receio de que o acoimassem de exaggerado. O verde dos campos apresentava a gradação vigorosa, que a luz de um formoso dia de inverno costuma dar-lhe.

      Christina interrompeu o silencio por fim.

      – O que eu não sei – principiou ella – é como o primo Henrique de Souzellas…

      – Onze! – atalhou a morgadinha, sem desviar os olhos do ponto da perspectiva, que fitava.

      – Onze quê? – perguntou Christina, erguendo os d'ella.

      – Com esta são onze as vezes que, esta tarde, depois de um longo silencio, abres a bôca para me falares no primo Henrique de Souzellas, uma vez que está decidido que seja primo.

      Christina fez um gesto de despeito e córou levemente.

      – E então que queres dizer com isso?

      – Eu? Nada. Digo só que são onze vezes com esta.

      – Não sabia que era prohibido falar-te no primo Henrique. Bem, n'esse caso falaremos em outra coisa. Está um tempo muito bonito: nem parece dezembro.

      – Não; vae magnifico para os nabaes – replicou Magdalena zombeteiramente.

      – Se não mudar com a nova lua – continuou Christina, ainda formalisada.

      – É excellente para seccar os milhos, que bem precisavam ainda d'isso, principalmente os das terras baixas.

      E, acabando de dizer estas palavras, a morgadinha desatou a rir.

      – Não sei de que te ris! – acudiu Christina, cada vez mais séria. – Pois não é esta a conversa de que tu gostas?

      – Ai, muito. Eu sou doida por estas coisas de lavoura; bem sabes. – E, mudando repentinamente de tom, accrescentou: – Ora vamos, Christe; não te zangues commigo.

      – Não, mas é que ás vezes não te entendo, a falar verdade. Vens com umas coisas que mettem raiva – respondeu-lhe Christina, sempre agastada.

      – Já estou arrependida; peço perdão. Fala lá á tua vontade no primo Henrique, fala; que eu não contarei as vezes que o fizeres.

      Christina reproduziu o gesto de impaciencia.

      – Agradeço a tua generosidade, mas já não tenho mais que dizer d'elle agora; por isso…

      – Pelo menos completa a duzia.

      – Lena! Então! Olha que se continuas com isso, fazes-me sair d'aqui.

      – Sempre queria que te vissem agora, Christe, esses que andam por ahi a gabar a docilidade do teu genio, as branduras da tua indole; queria que te vissem essa cara arrenegada, para saberem que tambem ha um acidozinho na tal doçura… Mas fazes-me a graça de só para mim teres d'essas franquezas.

      Christina sorriu, ainda que não de todo aplacada, ao ouvir esta reflexão da prima.

      – E não sabes a razão d'isso? – respondeu-lhe ella – a razão é o genio que tens, Lena. O teu gôsto é mortificares uma pessoa. Não ha santo que não perdesse a paciencia comtigo.

      – Que injustiça! que ingratidão! Eu, que sou a victima das tempestades que o teu genio pouco expansivo te junta no coração a todo o instante! Se alguma coisa te faz chorar, guardas as lagrimas para o meu quarto; se te irritam, vens desafogar as tuas cólerazinhas sobre a minha cabeça. E pagas-me assim!

      – És muito infeliz commigo. Pobre Lena!

      – Vamos, vamos, Christe! esquece o que eu disse ha pouco. Não te posso vêr assim. – E tomando um tom natural, mas sob o qual transparecia ainda certa malicia, Magdalena continuou: – Pois é verdade, dizias tu que não sabias por que o primo Henrique de Souzellas…

      Christina fez um movimento impaciente, como para levantar-se.

      – Então que é isso? Não me acceitas a expiação? – perguntou Magdalena, sorrindo.

      – Não; não quero que se fale mais no sr. Henrique de Souzellas. Vejo que te não é agradavel que as outras se occupem d'elle. Sejam quaes forem as razões que tens para isso…

      – Bravo! Foi admiravel de maldade o entono com que disseste esse: «Sejam quaes forem СКАЧАТЬ