A Revolução Portugueza: O 31 de Janeiro (Porto 1891). Abreu Francisco Jorge de
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СКАЧАТЬ nos attribuiam, de exercermos jurisdicção em territorios d'Africa, onde não tinhamos occupação effectiva, e invocava, para justificar o seu protesto, as decisões da conferencia de Berlim.

      «Mais tarde, em 1888, sir James Fergusson pronunciava na Camara dos Communs um discurso que fez impressão em Portugal, mas nem por isso deixou de constituir uma negação severa, que o governo britannico officialmente apoiou, dos direitos de soberania, invocados pelo governo portuguez, sobre o sertão da Africa Oriental. Quando, apoz o tratado feito pela Inglaterra com o regulo Lobengulo, o governo portuguez quiz definir, por uma delimitação, a posse dos territorios da Africa Oriental (outubro de 1888) o governo britannico, presentindo que não chegaria a uma rapida conciliação, fez-lhe sentir, pelo ministro em Lisboa, sir George Petre, que o estado das relações entre os dois governos, no que se referia ás questões africanas, «estava longe de ser satisfatorio, e que uma prolongação d'esse estado podia conduzir a uma seria quebra de amizade entre os dois paizes.»

      Em janeiro de 1889, o marquez de Salisbury queixava-se ao representante de Portugal em Londres de que o governo lusitano tivesse feito partir para a Africa e com destino mysterioso (aos territorios do Nyassa) a expedição do capitão tenente Antonio Maria Cardoso e avisava o diplomata portuguez «de que as boas relações dos dois paizes não podiam por muito tempo resistir ao perigo a que estavam sendo expostas». Essa expedição, á data da queixa do marquez de Salisbury, acampava no Monte Melange e luctava não só com as febres mas tambem com a falta de carregadores, parte dos quaes havia fugido. E facto curioso: emquanto o ministro inglez mostrava ao representante de Portugal apprehensões sobre o objectivo principal da expedição, «que lhe parecia ser o territorio occupado pelas missões e estações commerciaes inglezas», os indigenas da região atravessada por Antonio Maria Cardoso desfaziam-se em queixas contra os subditos britannicos, considerando-os d'uma tyrannia excepcional.

      Em resumo: os inglezes, antes mesmo de occorrer o facto que mais tarde invocaram como a causa directa do rompimento de relações com o nosso paiz, já preparavam o golpe, aproveitando todos os ensejos de insinuar na diplomacia portugueza a ideia de que cedo ou tarde rebentaria o conflicto e de que este seria motivado essencialmente pela nossa politica e a nossa acção na Africa Oriental. O ultimatum de 1890 surprehendeu até certo ponto a população portugueza. O mesmo não succedeu, por certo, aos governantes, que estavam fartos de saber que a Grã-Bretanha só espreitava o momento favoravel de nos enviar essa ameaça humilhadora.

      Ha quem attribua ao ministro do gabinete progressista que mais de perto lidou com a diplomacia ingleza intenções criminosas. Cremos, porém, que isso é exagerado. O ministro em questão, o sr. Barros Gomes, deve antes talvez ser accusado de incompetencia e inhabilidade. As cousas ter-se-hiam naturalmente passado de modo diverso se, quando appareceu na tela da discussão diplomatica a contestação da Inglaterra aos direitos que Portugal affirmava ter em varios territorios da Africa Oriental, o ministro, longe de empregar processos dilatorios, houvesse sem perda de tempo sujeitado o litigio ao exame e decisão d'uma conferencia das potencias signatarias do Acto Geral de Berlim. Por outro lado, como a Inglaterra fundamentava a sua contestação em que esses territorios nunca tinham sido occupados d'um modo effectivo por Portugal nem soffrido a menor influencia civilisadora, ao governo da epoca incumbia logicamente desmentir com actos, e não com palavras, os argumentos utilisados pela poderosa Albion.

      Mas o ministro culpado entendeu dever manter até quasi ás vesperas do ultimatum uma attitude de indecisão e de pusillanimidade e assim, quando se iniciou a occupação definitiva dos territorios contestados, lançando-se atravez d'Africa algumas expedições, todas ellas chocaram innumeros obstaculos que precipitaram logicamente o desfecho da questão. O ministro n'essa altura ainda quiz emendar a mão; era tarde, porém, e os erros diplomaticos por elle commettidos não permittiam já que se recorresse á arbitragem internacional. Portugal tinha que aguentar a pé firme e sem esquiva tudo o que a Grã-Bretanha sobre elle fizesse desabar.

      CAPITULO III

      Serpa Pinto, á frente de 6000 homens, derrota os makololos revoltados

      A expedição Serpa Pinto, já o dissemos, foi o rastilho que faz detonar a ameaça contida no ultimatum. Contemos como o caso se deu:

      A expedição tinha por mobil o affirmar a soberania de Portugal nos territorios do Nyassa, que o nosso paiz reivindicava. Commandava-a aquelle major do exercito e compunham-na varios funccionarios e technicos. O engenheiro chefe da missão de estudo era o sr. Pereira Ferraz. Em fins de 1899, Serpa Pinto, sahindo de Messanje em direcção a Quelimane, entregou-lhe o commando da expedição, emquanto outro funccionario, o sr. Themudo, seguia para Mupasso com parte da gente e as embarcações transportando bagagens e mantimentos. O sr. Pereira Ferraz acompanhado d'uns duzentos homens dirigiu-se para ali a encontrar o seu collega de missão – disposto a acampar defronte de Mupasso para seguir á risca as instrucções do commandante em chefe. Tratava-se, não é mau repetir, de pacificar a região, que alguns pretos insubordinados «animados por uma influencia estranha, tentavam revoltar contra nós».

      Os effeitos d'essa attitude hostil não se fizeram esperar. Logo que a expedição chegou em frente da aldeia dos makololos, viu-se fóra do recinto da povoação varios homens armados e «dentro appareceram por cima da palissada muitas cabeças, ao todo talvez uns duzentos negros promptos a entrar em combate». O sr. Pereira Ferraz fez signaes para parlamentar com o que parecia ser o chefe dos pretos, o qual lhe correspondeu fazendo signal para que se approximasse. O sr. Ferraz queria dizer-lhe que não ia disposto á guerra, portanto que deixassem passar a sua gente e cargas e que lhe daria um presente.

      «Não me deixou, porém – informa o mesmo engenheiro – o negro dizer nada d'isso, pois logo que nos viu ao alcance das espingardas de pederneira com que elle e os outros estavam armados, disparou sobre nós, fugindo para dentro do recinto, pelo que, chamando alguns dos nossos, que eu posso affirmar não passavam de 40, fizemos fogo sobre a povoação, que elles abandonaram com perda de 6 homens e umas 12 barricas de polvora, que explodiram no incendio que os landins lançaram ás palhotas da aldeia».

      Por aqui se vê que os pretos tinham o firme proposito de aggredir a expedição. Esta pouco depois era avisada de que os regulos Massêa, Catanga, Molidima, Caberenguene e os filhos do Chipitura haviam reunido e armado a sua gente e se tinham juntado a Melaure para baterem os nossos. Estas informações aterradoras, note-se, foram ministradas á expedição pelos inglezes Harry e George Petit, accrescentando-lhes que o Melaure tinha comsigo muita gente, muita polvora e 6:000 espingardas. Um e outro d'esses agentes britannicos correspondiam-se com aquelle regulo e, tendo o sr. Pereira Ferraz convidado ambos, para maior segurança das suas fazendas e vidas, a retirarem-se para a povoação portugueza de Natumbe, a dois dias de viagem ao sul de Mupasso, pondo ás suas ordens, para isso, as necessarias embarcações, responderam-lhe que preferiam antes ir to up, sahindo logo no dia immediato em direcção ao norte, tentando ainda assim e infructiferamente lançar o panico entre os auxiliares portuguezes.

      Os makololos, refeitos do primeiro embate, saltaram sobre a povoação portugueza de Samoane e, em territorio nosso, destruiram o caminho collimado e atravessaram n'elle espinheiros, dizendo que até ali tudo lhes pertencia e que matariam quem se atrevesse a collimar um palmo de terra d'ali para cima. Os indigenas de Samoane fugiram aterrados a acolher-se á protecção do sr. Pereira Ferraz e este engenheiro julgou mais prudente collocar-se em guarda e esperar reforços que pediu ao governador de Quelimane.

      Foi depois d'sto que o major Serpa Pinto, accudindo com mais gente á expedição e elevando o seu contigente a uns 6.000 homens armados, marchou sobre os negros revoltados e travou com elles em Mupasso sangrento combate. Os makololos deixaram mortos no campo uns 72 homens e muitos prisioneiros importantes. A expedição poz-se novamente em marcha apoz a victoria, que, diga-se desde já, teve no estrangeiro uma extraordinaria resonancia. Na Africa Oriental e principalmente na região sublevada o effeito não foi menor. O sultão Macanjira estabelecido nas margens do Nyassa prestou vassalagem a Portugal. O chefe M'ponda apressou-se СКАЧАТЬ